Direito Internacional dos Refugiados na América Latina. O Plano de Ação do México e o Vaticínio de Hannah Arendt


Masterarbeit, 2009

125 Seiten, Note: 10


Leseprobe


Inhaltsverzeichnis

INTRODUÇÃO

CAPÍTULO I - OS PÁRIAS DA HUMANIDADE: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONSTITUIÇÃO DO INSTITUTO DO REFÚGIO
1.1 Antecedentes históricos do Direito de Asilo
1.1.1 O Direito de Asilo na antiguidade e no medievo: o Direito de Asilo religioso.
1.1.2 A inovação da Revolução Francesa: o Direito de Asilo Político.
1.1.3 Direito de asilo, asilo político e refúgio
1.2 A consolidação do Instituto do Refúgio
1.2.1 Perspectiva coletiva, de grupo étnico ou nacional
1.2.1.1 Abordagem jurídica (1920-1935)
1.2.1.2 Abordagem social (1935-1939)
1.2.2 Perspectiva individualista (1938-1950)
1.2.3 Convenção de 1951 e Protocolo de 1967
1.3 A tradição latino-americana na proteção dos refugiados: a ampliação do conceito de refugiado, a preocupação com os deslocados Internos e a busca de soluções duráveis
1.3.1 A ampliação do conceito de refugiado: a Declaração de Cartagena
1.3.2 A preocupação com os deslocados internos: a Declaração de San José sobre Refugiados e Deslocados Internos
1.3.3. A busca por soluções duráveis: a Declaração e o Plano de Ação do México

CAPÍTULO II - O DIREITO A TER DIREITOS: DECLARAÇÃO E PLANO DE AÇÃO DO MÉXICO E O VATICÍNIO DE HANNAH ARENDT
2.1 O Direito Internacional dos Refugiados e as três vertentes da proteção internacional dos direitos da pessoa humana
2.1.1 Direito Internacional dos Refugiados e Direito Internacional dos Direitos Humanos
2.1.2 Direito Internacional dos Refugiados e Direito Internacional Humanitário
2.2 Uma perspectiva dos refugiados a partir da obra de Hannah Arendt
2.2.1 A condição de refugiada como impulsionadora do pensamento de Hannah Arendt.
2.2.2. As origens do totalitarismo e a categorização dos campos de refugiados
2.2.3.Vita activae as três atividades fundamentais à Condição Humana: Labor, Trabalho e Ação.
2.3 Cidades Solidárias, Fronteiras Solidárias e Reassentamento Solidário: humanizando o Direito Internacional dos Refugiados.
2.3.1 Informações fundamentais para o entendimento do contexto colombiano: Conflitos armados e o “abarrotamento” das fronteiras
2.3.2 Os três programas que integram o PAM: as três solidariedades e o vaticínio de Hannah Arendt

CONSIDERAÇÕES FINAIS

REFERÊNCIAS

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

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AGRADECIMENTOS

A Deus, que me ensina diariamente os verdadeiros valores da vida e me sustenta, principalmente, nos momentos em que o ser humano já não tem condições de fornecer respostas.

À minha família, pelo compartilhamento de conquistas e preocupações. A nossa união me deu forças para tornar realidade alguns sonhos e crescer, pois sempre estiveram dispostos a me incentivar em qualquer atividade. Sei que independentemente da situação que me encontrar poderei contar com o apoio e amor incondicional de vocês. Amo muito vocês!

À minha Mãe, “sombra grande de figueira para um matear tranqüilo, força de touro para as pegadas brabas da vida, doçura de figada com leite”. Por ser um modelo para mim!

Ao meu Pai, “Yes, my heart belongs to daddy” !

Ao meu irmão Bruno, companheiro de uma vida e certamente de outras, “Seus olhos meu clarão. Me guiam dentro da escuridão. Seus pés me abrem o caminho. Eu sigo e nunca me sinto só“.

À Universidade Federal de Santa Maria e ao Mestrado em Integração Latino-americana, pela oportunidade de ter todas essas vivências e pelo orgulho de ter pertencido ao seu corpo discente.

A CAPES pelo apoio financeiro durante a elaboração desse trabalho.

À Maristela Ribas Smidt, secretária e coração do MILA. Nossa mãezona, pela dedicação e disponibilidade para ajudar sempre.

A todos os meus professores, semi-deuses, pela possibilidade de convivência, pelos ensinamentos, pela paciência e pela simples passagem na minha vida, em especial:

Ao meu orientador, Professor Luiz Ernani Bonesso de Araújo, pela compreensão e credibilidade depositada em mim durante o desenvolvimento deste trabalho. Seus ensinamentos serão essenciais na conquista do meu espaço e na maneira de observar o mundo.

À minha co-orientadora, Professora Jânia Maria Lopes Saldanha, por ter confiado nas minhas idéias, por ensinar e, principalmente, inspirar os caminhos para a realização deste trabalho.

Ao Professor Jorge Luiz da Cunha, que me ofereceu, durante as aulas e no exame de qualificação, muitas sugestões, conselhos e críticas fundamentais ao desenvolvimento desse trabalho.

Ao professor Gilmar Antônio Bedin, antecipadamente, pela generosidade em atender ao pedido de compor a banca examinadora.

Ao Professor Ricardo Seitenfus, por ter confiado a disciplina de Direito Internacional Público aos meus cuidados.

À Professora Maria Catarina Chitolina Zanini pela disponibilidade e por me proporcionar participar do grupo do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Migratórios, NIEM – RJ.

Às professoras Silvia Menicucci de Oliveira Selmi Apolinário e Liliana Lyra Jubilut pelas sugestões e incentivo ao estudo da causa dos refugiados.

À professora Daizy Valmorbida Stepansky por ter me recebido no Rio e pelas conversas e conselhos que foram decisivos na escolha da temática desta dissertação.

Aos professores do colegiado, Adayr da Silva Ilha, Diorge Konrad, Luiz Ernani Bonesso de Araújo e Jânia Maria Lopes Saldanha, com os quais tive o privilégio de conviver e muito aprender.

Ao Antonio pelos conselhos e por estar sempre disposto a ajudar.

Aos meus queridos amigos e colegas, por simplesmente existirem e me ensinarem a ser uma pessoa melhor e mais completa, em especial Alexandre Maccari, Ademar Pozzatti Junior, Vinícius Vieira, Nielle Villanova, Vitor Ferreira, Ana Lélia Beltrame, Camila Baraldi, Pâmela Marques, Roger Machado, Leonardo Botega, Otto Schmid, Roger Brutti, Ervandil Costa e Artêmio Marques.

A Cristina Crespam e ao Marcos Palermo, pelo incentivo, pelos conselhos tão valiosos e por estar comigo em todos os momentos. Por simplesmente serem quem são!

Ao tio Patrício, à tia Marilu, ao tio Dado e aos meus padrinhos, tio Tony e tia Néglia, pelo apoio e por acreditarem tanto em mim.

Ao tio Júlio, grande incentivador, à tia Marilice e aos meus queridos primos Rafael Henrique e Felipe Lorenzo, por terem me recebido em São Paulo durante as minhas pesquisas.

Ao Beto, por tudo que representou para mim e por infelizmente ter me dado conta de que juntos não seria possível terminar este trabalho.

À Professora Sueli Minello, pelas revisões cuidadosas dos originais deste trabalho.

À Peque, minha companheira de estudo, pela agradável companhia de longos dias e noites na frente do computador.

A minha saudosa gata de estimação, Gatija que foi uma carinhosa companheira durante 8 anos da minha vida e em quase toda a escrita desta dissertação.

A todos que direta ou indiretamente contribuíram de alguma forma para a realização deste trabalho.

EPÍGRAFE

Os lábios comprimidos contra o tubo de âmbar do cachimbo, a barba esmagada pela gargantilha de ametista, os dedões do pé nervosamente dobrados dentro dos chinelos de seda, Kublai Khan ouvia os relatórios de Marco Pólo sem se mover. Era uma daquelas noites em que um vapor hipocondríaco premia o seu coração.

- As suas cidades não existem. Talvez nunca tenham existido. Certamente não existirão nunca mais. Por que enganar-se com essas fábulas consolatórías? Sei perfeitamente que o meu império apodrece como um cadáver no pântano, que contagia tanto os corvos que o bicam quanto os bambus que crescem adubados por seu corpo em decomposição. Por que você não me fala disso? Por que mentir para o imperador dos tártaros, estrangeiro?

Pólo reiterava o mau humor do soberano.

- Sim, o império está doente e, o que é pior, procura habituar-se às suas doenças. O propósito das minhas explorações é o seguinte: perscrutando os vestígios de felicidade que ainda se entrevêem, posso medir o grau de penúria. Para descobrir quanta escuridão existe em torno, é preciso concentrar o olhar nas luzes fracas e distantes.

Trecho de As cidades invisíveis,

de Italo Calvino.

RESUMO

Dissertação de Mestrado

Mestrado em Integração Latino-americana

Universidade Federal de Santa Maria

DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS NA AMÉRICA LATINA:

O PLANO DE AÇÃO DO MÉXICO E O VATICÍNIO DE HANNAH ARENDT

Autora: Stefania Eugenia Barichello

Data e local da Defesa: Santa Maria, 19 de junho de 2009.

A América Latina tem experimentado nos últimos anos casos graves de deslocamento forçado de indivíduos, fenômeno acompanhado pela adoção de uma série de iniciativas que parecem apontar para esforços reparadores situados entre os mais bem sucedidos no mundo. O enfoque desse trabalho no Direito Internacional dos Refugiados na América Latina justifica-se diante da tradição latino-americana em matéria de asilo, refúgio e direitos humanos e pretende contribuir ao procurar examinar as propostas solidárias do Plano de Ação do México à luz do pensamento de Hannah Arendt. O objetivo geral desta dissertação é investigar como se configurou a questão do Direito Internacional dos Refugiados na América Latina, desde a Declaração de Cartagena para Refugiados de 1984 até o Plano de Ação do México de 2004, no sentido de contribuir para a construção de um regime de tratamento latino-americano sui generis. O fio condutor da reflexão é o pensamento de Arendt sobre os requisitos básicos para o exercício da condição humana, pois no mundo contemporâneo persistem situações sociais, políticas e econômicas que contribuem para tornar os homens supérfluos e sem lugar em um mundo comum. O texto está dividido em dois capítulos. O primeiro objetiva proporcionar uma compreensão da constituição do instituto do refúgio e sua consolidação sob uma perspectiva coletiva (jurídico-social) e individualista. O segundo visa compreender o Direito Internacional dos Refugiados na América Latina, mais especificamente o Plano de Ação do México, à luz do legado intelectual de Arendt, em especial da acepção de cidadania como “direito a ter direitos”, fundamental à condição humana e construída coletivamente no espaço público. As considerações finais sinalizam pontualmente os avanços das propostas dos três programas do Plano de Ação do México em busca de soluções mais duráveis e à possibilidade, aos refugiados e solicitantes de refúgio, de uma vida que vá além da vida biológica e possa chegar à ação política e a uma condição humana plena, como vaticinou Hannah Arendt.

Palavras-chaves: Direito Internacional dos Refugiados, América Latina, Plano de Ação do México, Hannah Arendt

ABSTRACT

Master thesis

Master in Latin American Integration

Universidade Federal de Santa Maria

INTERNATIONAL REFUGEE LAW IN LATIN AMERICA:

THE MEXICO PLAN OF ACTION AND THE HANNAH ARENDT’S PROPHECY

Author: Stefania Eugenia Barichello

Date and place of presentation: Santa Maria, June 19th 2009.

Latin America has been experiencing in the last years critical cases of forced displacement. This phenomenon is followed by the adoption of a series of initiatives that seem to follow successful efforts around the world. The approach of this thesis on International Refugee law in Latin America is justified on the Latin American tradition in terms of asylum, refugee and human rights, and intends to contribute by analysing the solidarity proposals of Mexico’s Plan of Action based on the thought of Hannah Arendt. The general objective of this thesis is to investigate how the question of the International Refugee law in Latin America was configured, from the Cartagena Declaration on Refugees of 1984 until the Mexico Plan of Action of 2004, in order to contribute for the building of a sui generis Latin American treatment regimen. The line of thought follows the reflection by Arendt on the basic requirements for the exercise of the human condition. Contemporary social, economic and political situations contribute to make men more superfluous and without a place in the world. The text is divided in two chapters. The first intends to provide an understanding of the asylum constitution and its consolidation under a juridical, social and individualist approach. The second chapter aims at understanding the International Refugee Law in Latin America, more specifically the Mexico Plan of Action , on the light of the intellectual legacy of Arendt. It pays particular attention to the meaning of citizenship as “the right to have rights”, fundamental to the human condition and collectively constructed in the public space. The final considerations point out to the advances of the proposals of the Mexico Plan ’s three programs in the search for more durable solutions and for the possibility for refugee and asylum seekers to have a life that goes beyond the biological life. What is more, a life that can reach political action and a full human condition, as prophesized Hannah Arendt.

Key words: International Refugee Law, Latin America, Mexico Plan of Action, Hannah Arendt

RESÚMEN

Tesis de Maestría

Maestría en Integración Latinoamericana

Universidade Federal de Santa Maria

DERECHO INTERNACIONAL DE LOS REFUGIADOS EN AMERICA LATINA:

EL PLAN DE ACCIÓN DE MÉXICO Y EL VATICINIO DE HANNAH ARENDT

Autora: Stefania Eugenia Barichello

Fecha y local de presentación: Santa Maria, 19 de junio de 2009.

La América Latina ha experimentado en los últimos años graves desplazamientos forzosos de individuos, fenómeno acompañado por la adopción de una serie de iniciativas que parecen apuntar a esfuerzos reparadores entre los más bien sucedidos en el mundo. El enfoque de la tesis en el Derecho Internacional de los refugiados en América Latina se justifica por la tradición latinoamericana en materia de asilo, refugio e derechos humanos y pretende contribuir al buscar examinar las propuestas solidarias del Plan de Acción de México a la luz del pensamiento de Hannah Arendt. El objetivo principal de la tesis es investigar como se ha configurado la cuestión del Derecho internacional de los refugiados en Latinoamérica desde la Declaración de Cartagena del 1984 hasta el Plan de Acción de México del 2004, en el sentido de contribuir para la construcción de un régimen de tratamiento sui generis. El hilo conductor de la reflexión es el pensamiento de Arendt sobre los requisitos básicos para el ejercicio de la condición humana, pues en el mundo contemporáneo persisten situaciones sociales, políticas y económicas que ayudan a tornar los hombres superfluos y sin lugar en un mundo común. El texto esta dividido en dos capítulos. El primer busca proporcionar una comprensión de la constitución del refugio e su consolidación bajo una perspectiva colectiva (jurídico-social) e individualista. El segundo objetiva comprender el Derecho Internacional de los Refugiados en América Latina, más específicamente, el Plan de Acción de México bajo el legado intelectual de Arendt, especialmente en la acepción de la ciudadanía como el “derecho a tener derechos”, fundamental a la condición humana y constituida colectivamente en el espacio público. Las consideraciones finales apuntan los avances de las propuestas de los tres programas del Plan de Acción de México en la búsqueda por soluciones duraderas y la posibilidad de los refugiados y solicitantes de refugio tengan una vida que va más allá de la vida biológica y que puedan llegar a una acción política y a una condición humana plena, como ha vaticinado Hannah Arendt.

Palabras claves: Derecho Internacional de los Refugiados, América Latina, Plan de Acción de Mexico, Hannah Arendt

SINTESI

Tesi di Master

Master in Integrazione Latino-americana

Universidade Federal de Santa Maria

DIRITTO INTERNAZIONALE DEI RIFUGIATI IN AMERICA LATINA:

IL PIANO DI AZIONE DEL MESSICO E IL VATICINIO DI HANNAH ARENDT

Autore: Stefania Eugenia Barichello

Data e luogo di discuzione: Santa Maria, 19 giugno 2009.

L’America latina, negli ultimi anni, ha sperimentato casi gravi di sfollamento forzato di individui; questo fenomeno è stato accompagnato da una serie di iniziative che sembrano registrare i migliori risultati al mondo. Il focus di questo lavoro intorno al Diritto Internazionale dei Rifugiati in America Latina, si avvale dell’esperienza della tradizione latino-americana in materia di asilo, rifugio e diritti umani e intende contribuire ad un esame delle proposte solidari del Piano di Azione del Messico alla luce del pensiero di Hanna Arendt. L’obiettivo generale di questa dissertazione è di investigare le modalità con cui si è configurata la questione del Diritto Internazionale dei Rifugiati in America latina, dalla Dichiarazione di Cartagena sui Rifugiati del 1984, passando per la Dichiarazione di San José sui rifugiati e gli sfollati interni del 1994, sino al Piano di Azione del Messico del 2004, nella definizione di un regime di trattamento latino-americano sui generis. Il filo conduttore della riflessione è il pensiero che Hanna Arendt ha in merito ai requisiti basici per l’esercizio e la condizione della vita umana, visto che nel mondo contemporaneo continuano a esistere situazioni sociali, politiche ed economiche che contribuiscono a rendere gli uomini superflui nel proprio spazio e senza dimora in un mondo comune. Il testo della seguente dissertazione è diviso in due capitoli. Il primo si propone di inquadrare la comprensione della costituzione dell’istituto del rifugio e la sua consolidazione sotto una prospettiva collettiva (giuridico e sociale) e individualista. Il secondo, intende comprendere il Diritto Internazionale dei Rifugiati in America latina, più specificatamente il Piano di Azione del Messico, alla luce del pensiero intellettuale di Hanna Arendt, con particolare riguardo all’adozione della cittadinanza come “diritto ad avere diritti”, fondamentale per la condizione umana e costruita collettivamente nello spazio pubblico. Le considerazioni finali intendono segnalare in un modo più puntuale gli avanzamenti delle proposte dei tre programmi del Piano di Azione del Messico verso la ricerca di soluzioni più durature e l’offerta ai rifugiati ed ai richiedenti rifugio di possibilità di una vita che vada al di là della vita biologica, così come contenuto nel pensiero di Hannah Arendt.

Parole chiave: Diritto Internazionale dei Rifugiati, America latina, Piano di Azione del Messico, Hannah Arendt.

INTRODUÇÃO

Os deslocamentos forçados de grandes contingentes humanos vêm chamando a atenção da comunidade internacional. Nesses grupos que migram forçadamente se inserem os deslocados internos, os apátridas, os asilados, bem como o objeto deste estudo, os refugiados. Conforme a Convenção de Genebra de 1951, refugiados são aquelas pessoas que são obrigadas a abandonar sua terra natal e procurar a proteção de outros Estados por terem sido ameaçadas de perseguição (ou efetivamente perseguidas) por motivos de raça, religião, nacionalidade ou filiação a determinado grupo social ou político.

Ao investigar o fenômeno dos refugiados na América Latina, é importante recordar que praticamente todos os países latino-americanos ratificaram a Convenção de Genebra, de 1951, e o Protocolo sobre o Estatuto do Refugiado, de 1967. Esse fato é acrescido de algo com particular significado: a ampliação do conceito de refugiado instituído na Declaração de Cartagena, de 1984. A Declaração vai além da idéia de perseguição individualizada por motivos de raça, religião, nacionalidade, pertença a certo grupo social ou opiniões políticas (razões que aparecem na Convenção de 1951), pois inclui na categoria de refugiados também aquelas pessoas que deixaram seu país de origem por causa da guerra, da violação massiva de direitos humanos ou de causas similares que perturbem gravemente a ordem pública.

Por ocasião do seu décimo aniversário da Declaração de Cartagena, em 1994, a importância da Declaração foi reiterada dando origem à Declaração de San José sobre Refugiados e Deslocados Internos, a qual menciona a necessidade de enfrentar a problemática dos deslocados internos na região.

Em 2004, a celebração dos 20 anos da Declaração de Cartagena foi marcada por iniciativas que levaram a sociedade latino-americana e caribenha a refletir sobre o seu sentido conceitual e simbólico e conclamar os Estados a promover uma atualização da Declaração. Desse trabalho resultou o Plano de Ação do México, uma resposta regional aos novos focos de conflito no continente, como os da Colômbia e do Haiti, assim como aos impactos desses conflitos nos países vizinhos. O PAM define as linhas de uma ação regional em matéria de proteção e propõe a adoção de medidas duráveis para a questão dos refugiados, especialmente para fazer face às duas situações que necessitam urgente resposta: o crescente fluxo de refugiados assentados nos grandes núcleos urbanos da América Latina e o fenômeno das fronteiras abarrotadas. Suas propostas incluem a adoção de três programas: “Cidades Solidárias”, “Fronteiras Solidárias” e “Reassentamento Solidário”.

Apesar de a América Latina ter experimentado, nos últimos anos, casos graves de deslocamento, como o caso dos refugiados e deslocados internos colombianos, o seu histórico de utilização de uma série de iniciativas relativas à temática dos refugiados parece apontar para um dos esforços reparadores dos mais bem sucedidos no mundo, fenômeno merecedor de estudos acadêmicos mais aprofundados.

A Declaração de Cartagena para refugiados de 1984, a Declaração de San José sobre refugiados e deslocados internos de 1994 e o Plano de Ação do México de 2004, aplicados ao caso específico dos Refugiados na América Latina, parecem estar contribuindo para a construção de um regime de tratamento latino-americano sui generis. Essa constatação leva à seguinte questão:

A evolução do tratamento prestado aos refugiados na América Latina, em especial a adoção de iniciativas duráveis pelo PAM, por meio de seus três programas solidários, aponta para um esforço no sentido do exercício da condição humana proposta por Hannah Arendt [em seus três princípios basilares: labor, trabalho e ação], mais especificamente em direção à ação política como essencial à condição humana plena, ou ao direito de ter direitos.

A presente pesquisa justifica-se como uma contribuição para os estudos referentes ao Direito Internacional dos Refugiados, um ramo de crescente importância no Direito Internacional que se encontra, com autonomia própria, entre o campo dos Direitos Humanos e o do Direito Humanitário. Ademais, o recorte específico sobre o Direito Internacional dos Refugiados na América Latina, justifica-se diante da tradição latino-americana em matéria de asilo, refúgio e direitos humanos e pretende contribuir ao procurar examinar as propostas solidárias do Plano de Ação do México à luz do pensamento de Hannah Arendt.

O tema proposto enquadra-se na Linha de Pesquisa denominada “Políticas Públicas Regionais e Desenvolvimento”, do Programa de Pós-graduação em Integração Latino-Americana da Universidade Federal de Santa Maria, ao propor um estudo do Direito Internacional dos Refugiados na América Latina, por meio das normas regionais de proteção aos refugiados. Principalmente, por tal linha se propor a contribuir, sob o ponto de vista das relações externas, para o fortalecimento da América Latina no cenário internacional, e das relações globalizadas, pelo estudo de políticas públicas regionais voltadas ao desenvolvimento e ao atendimento dos valores democráticos e do respeito aos direitos humanos.

O objetivo geral desta dissertação é investigar como se configurou a questão do Direito Internacional dos Refugiados na América Latina, desde a Declaração de Cartagena para Refugiados de 1984 até o Plano de Ação do México de 2004, no sentido de contribuir para a construção de um regime de tratamento latino-americano sui generis.

Os objetivos específicos configuram-se em: investigar a constituição do instituto do refúgio e sua consolidação sob uma perspectiva coletiva (jurídico-social) e individualista, além da tradição latino-americana de proteção ao refugiado; refletir sobre a tradição latino-americana na proteção dos refugiados, incluindo a ampliação do conceito de refugiado proporcionada pela Declaração de Cartagena de 1984, a preocupação com os deslocados Internos expressa na Declaração de San José sobre refugiados e deslocados internos e a busca por soluções duráveis expressa no Plano de Ação do México e suas propostas solidárias; e compreender o Direito Internacional dos Refugiados na América Latina, mais especificamente o Plano de Ação do México (PAM), à luz do legado intelectual de Hannah Arendt, em especial da acepção do “direito a ter direitos” como própria da condição humana.

O fio condutor da reflexão desse trabalho dissertativo é o pensamento de Hannah Arendt sobre os requisitos básicos para o exercício da condição humana, pois no mundo contemporâneo continuam a persistir situações sociais, políticas e econômicas que contribuem para tornar os homens supérfluos e sem lugar em um mundo comum.

O texto da presente dissertação está dividido em dois capítulos: Os párias da humanidade: histórico e constituição do instituto do refúgio e O direito a ter direitos: Declaração e Plano de Ação do México e o vaticínio de Hannah Arendt, cada um deles subdividido em três partes.

O primeiro capítulo objetiva proporcionar uma compreensão da constituição do instituto do refúgio e sua consolidação sob uma perspectiva coletiva (jurídico-social) e individualista, atentando para a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967, e fornecer bases teóricas para refletir sobre a problemática do refugiado. O capítulo está dividido em três partes: a primeira, denominada Antecedentes históricos do Direito de asilo, subdivide-se em O Direito de asilo na antiguidade e no medievo: o Direito de Asilo religioso, A inovação da Revolução Francesa: o Direito de Asilo Político e Direito de asilo, asilo político e refúgio. A segunda parte intitulada A consolidação do Instituto do Refúgio trata da perspectiva coletiva, tanto em sua abordagem jurídica (1920-1935) como social (1935-1939) e da perspectiva individualista (1938-1950) e chega à Convenção de 1951 e ao Protocolo de 1967. A terceira parte reflete sobre a tradição latino-americana na proteção dos refugiados, incluindo a ampliação do conceito de refugiado proporcionada pela Declaração de Cartagena de 1984; a preocupação com os deslocados Internos expressa na Declaração de San José sobre refugiados e deslocados internos; e a busca por soluções duráveis, expressa no Plano de Ação do México e suas propostas solidárias.

O segundo capítulo visa compreender o Direito Internacional dos Refugiados na América Latina, mais especificamente o Plano de Ação do México (PAM), à luz do legado intelectual de Hannah Arendt, em especial da acepção de cidadania como “direito a ter direitos”, fundamental à condição humana e construída coletivamente no espaço público. O capítulo subdivide-se em três partes. A primeira, Direito Internacional dos Refugiados e as três vertentes da proteção internacional dos direitos da pessoa humana, aborda as relações que se estabelecem entre o Direito Internacional dos Refugiados e os Direitos Humanos e o Direito Internacional Humanitário. A segunda parte reflete sobre a problemática dos refugiados a partir da obra de Arendt, destacando a sua perspectiva de refugiada e sua opção por uma posição mais política do que filosófica. Prioriza duas de suas obras As origens do totalitarismo e A Condição Humana para refletir sobre as três atividades humanas fundamentais à condição humana: labor, trabalho e ação, essa última compreendida como o exercício da ação política entre os seres humanos no espaço público. A terceira parte denominada Cidades Solidárias, Fronteiras Solidárias e Reassentamento Solidário: humanizando o Direito internacional dos Refugiados traz informações sobre o contexto político social da Colômbia, especialmente sobre os conflitos armados e a questão do “abarrotamento” das fronteiras que foram motivadores para a elaboração do PAM e busca, ainda, estabelecer relações entre os três programas solidários que integram o PAM e o legado de Arendt sobre a problemática da condição humana.

As considerações finais, produto da reflexão realizada no decorrer do trabalho, procuram sinalizar mais pontualmente os avanços das propostas dos três programas do Plano de Ação do México em busca de soluções mais duráveis e à possibilidade, aos refugiados e solicitantes de refúgio, de uma vida que vá além da vida biológica e possa chegar à ação política e a uma condição humana plena, como vaticinou Hannah Arendt.

CAPÍTULO I - OS PÁRIAS DA HUMANIDADE: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONSTITUIÇÃO DO INSTITUTO DO REFÚGIO

Nadie quiere saber que la historia contemporánea ha creado una nueva clase de seres humanos: la clase de los que son confinados en campos de concentración por sus enemigos y en campos de internamiento por sus amigos [1] /[2].

Este capítulo visa proporcionar uma compreensão da constituição do instituto do refúgio e sua consolidação sob uma perspectiva coletiva (jurídico-social) e individualista, atentando para a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967, bem como fornecer bases teóricas para refletir sobre a problemática do refugiado, mais especialmente sobre a tradição latino-americana de proteção ao refugiado. O capítulo está dividido em três partes.

A primeira parte denominada Antecedentes históricos do Direito de asilo subdivide-se em O Direito de asilo na antiguidade e no medievo: o Direito de Asilo religioso; A inovação da Revolução Francesa: o Direito de Asilo Político; e Direito de asilo, asilo político e refúgio. Esta parte visa proporcionar base história para posterior reflexão.

A segunda, intitulada A consolidação do Instituto do Refúgio, trata da perspectiva coletiva, tanto em sua abordagem jurídica (1920-1935) como social (1935-1939), e da perspectiva individualista (1938-1950), e chega à Convenção de 1951 e ao Protocolo de 1967.

A terceira parte reflete sobre a tradição latino-americana na proteção dos refugiados, incluindo a ampliação do conceito de refugiado proporcionada pela Declaração de Cartagena de 1984; a preocupação com os deslocados Internos expressa na Declaração de San José sobre refugiados e deslocados internos; bem como a busca por soluções duráveis expressa no Plano de Ação do México e suas propostas solidárias.

1.1 Antecedentes históricos do Direito de Asilo

No Direito Internacional, a condição de estrangeiro - vinculada tradicional e estritamente à noção de soberania nacional - foi, em grande medida, objeto de tratamento recíproco ou equivalente nas relações bilaterais entre os Estados. O estrangeiro geralmente procura abrigo em outro local por motivos endógenos, visto não poder ter uma vida dita normal no seu país de origem. Essa procura é feita com o anseio de ser protegido, tanto por crime cometido, como em virtude de privações no meio onde está inserido, ou ainda, por discriminações, perseguições, motivos ideológicos, religiosos, culturais, raciais, filiação ou, ainda, por inserção num grupo social específico.

Ao partir, o estrangeiro busca alcançar em outro Estado, comunidade, aldeia, ou simples localidade uma proteção específica aos seus medos e receios. É precisamente essa noção de proteção que a palavra “asilo” representa. No sentido mais corrente, a palavra “asilo” significa um lugar privilegiado onde os perseguidos se encontram ao abrigo dos seus perseguidores[3]. Ou seja, asilo representa que um Estado outorgou proteção em seu território a nacionais de outro Estado, que fogem por temor de perseguição ou perigo grave. A noção de asilo engloba uma série de elementos, entre os quais figuram o princípio do non-refoulement, a permissão para permanecer no território do país de acolhida, e normas relativas ao trato humano[4].

Antes de prosseguir na temática específica deste trabalho, julga-se necessário aclarar o significado que instituto de asilo vem assumindo no decorrer dos séculos, desde o seu entendimento como prática religiosa, passando por um instrumento de afirmação da identidade e autoridade do Estado, até chegar, atualmente, a seu imbricamento ao status do refugiado, quando o Direito Internacional dos Refugiados passa a ser considerado como uma das três vertentes de proteção da pessoa humana.

1.1.1 O Direito de Asilo na antiguidade e no medievo: o Direito de Asilo religioso.

O instituto do asilo tem raízes muito antigas. A palavra asilo deriva do grego asulon (), substantivo que significa santuário, lugar inviolável, que provém do adjetivo neutro asulos (), que indica aquele contra quem não pode ser praticada a violência, ou seja, que é inviolável. O vocábulo é formado pela partícula negativa “a” e pela palavra sulon, que significa direito de apreender, quitar, tirar, sacar, extrair. Posteriormente, o vocábulo foi utilizado no latim como a sylum, designando também um lugar inviolável[5]. Portanto, na antiguidade, as duas características principais do Direito de Asilo, eram a sacralidade do lugar e a sua inviolabilidade.

Não é por acaso que se evoca a etimologia desse termo e, em especial, a sua raiz grega, dado que a gênese desse significante estava associada a práticas comumente utilizadas na Grécia Antiga, onde os perseguidos e os estrangeiros se beneficiavam de uma proteção e de um lugar inviolável.

O conceito de asilo foi primariamente associado aos lugares de culto e também a lugares naturais que, por características particulares, eram relacionados à presença divina. Há um sentido de inviolabilidade e segurança nesses locais que devem ser respeitados sob pena de afronta aos deuses[6].

Portanto, na antiguidade, o asilo delimita-se ao lugar sacro em questão, pois somente dentro do templo ou perto do lugar natural considerado sagrado, é possível gozar de sua proteção; à medida que a pessoa vai se afastando desse lugar, a proteção vai diminuindo até desaparecer[7].

O que faz o asilo religioso substancialmente diferente do asilo laico[8] é que, no primeiro, a sacralidade e a inviolabilidade do lugar são atribuídas à vontade divina, suprema e ultra-terrena, à qual evidentemente não é possível opor-se. Por esse motivo, parece impossível fazer prevalecer a lei do homem à lei de Deus, já que, por esta última, o indivíduo encontra proteção contra a justiça e a injustiça humana[9].

O asilo cristão, que apareceu no século IV d.C., conserva as características do asilo religioso pagão. Porém, não se dá somente devido à sacralidade do lugar de culto, mas também é fruto de um senso de dever que nasce da consciência cristã que prega o amor ao próximo e, sobretudo, à idéia de remissão dos pecados. Portanto, se um criminoso se asilava numa igreja para fugir da lei, a garantia de asilo e a proteção que se lhe oferecia era percebida como uma oportunidade de arrepender-se e, se fosse o caso, converter-se[10].

O Direito de Asilo cristão era o direito de encontrar refúgio em qualquer igreja consagrada, fugindo assim, inocentemente ou não, das leis temporais (dos homens). Essa proteção poderia ser encontrada, geralmente, nos templos, mosteiros, bosques sagrados e junto do imperador, sendo, posteriormente, na Idade Média, deslocada, com as “Leis das Sete Partidas”[11], para as igrejas e cemitérios[12].

Deve-se salientar ainda que, em várias épocas, muitos criminosos fizeram uso desse recurso para fugir de uma punição justa e não para escapar de outras formas de perseguição. Por esta razão e pelo momento da secularização do poder temporal, o direito de asilo religioso começou a ser obstaculizado e malvisto, além de ser considerado uma fonte de conflito entre a justiça eclesiástica e a laica[13].

No período compreendido entre o século X e XV, o direito de asilo foi objeto de uma gradual alteração, consequência de profundas mudanças ocorridas na Europa. Para Fischel de Andrade,

os séculos X a XIII revelaram uma forte perseguição a diversas minorias, como judeus, hereges e leprosos, segundo a decisão dos príncipes e prelados. O fim do século XIII e os posteriores séculos XIV e XV foram marcados pela dispersão dos judeus rumo ao norte da África, a países europeus, Itália, Turquia, países baixos e a possessões holandesas, espanholas e portuguesas em territórios americanos[14].

A sociedade hospitaleira para com o estrangeiro tornou-se uma sociedade egocêntrica e protecionista de suas fronteiras, gentes, cultura e religião. Culminando esse estado de espírito na repressão, na perseguição, isolamento e condenação ao exílio. A intolerância aliada à xenofobia levou a uma reformulação do direito de asilo. Esse foi um período de conquistas, de afirmação dos Estados e de imposição de uma cultura em detrimento de outras. Enfim, “a construção da identidade dos Estados com a consequente estigmatização da diferença, a todos os níveis”[15]. A laicização do asilo teve desdobramentos que culminaram com a sua inclusão, pela primeira vez, em uma constituição européia durante a Revolução Francesa, com a instituição do asilo político como se verá a seguir.

1.1.2 A inovação da Revolução Francesa: o Direito de Asilo Político.

No século XVI, com a Reforma[16], o poder eclesiástico foi perdendo a importância que outrora lhe fora atribuída na Idade Média, mais precisamente, no âmbito do Instituto do asilo[17].

Conforme ensina Fischel de Andrade, no século XVI, em decorrência da gradual perda de poder dos eclesiásticos, o direito de asilo perdeu a importância a ele concedida anteriormente. O autor afirma que:

com a Reforma, houve a paulatina decadência do poder eclesiástico, o que fez com que o direito de asilo fosse perdendo a reverência a ele reconhecida na Era Medieval; na fase medieval, instados pela força imanente do liame religioso que conjugava asilo e Igreja e pelo prestígio desta instituição, os governantes da Europa, motivados pela filosofia política universalista, abriram as portas de seus reinos aos que, pelas circunstâncias mais variadas, aí buscavam proteção. A Reforma ensejou o surgimento de asilados de praticamente todos os países europeus, tendo sido Genebra, provavelmente, o maior centro de protestantes franceses, ingleses e italianos perseguidos após a fuga de Calvo, da França, em 1541[18].

O instituto de asilo deixa de ser competência exclusiva da igreja para dar origem ao que se passou a denominar de laicização do instituto de asilo, ou seja, a competência de concessão desse Instituto vai-se transferindo gradualmente para o poder civil[19].

O século XVII foi culminante para o desenvolvimento do instituto de asilo. Nessa época, alguns dos precursores do Direito Internacional, como Suarez, Wolff e aquele que foi considerado, posteriormente, o Pai do Direito Internacional, Grotius, viam o instituto do Direito de Asilo como um Direito Natural e, portanto, uma obrigação do Estado[20].

Os Estados que concediam asilo agiam em benefício da comunidade, no estrito respeito do dever humanitário internacional que lhes era incumbido. Grotius defendia que as pessoas expulsas de seus países ou lares tinham o direito de residir permanente em outro Estado, devendo, contudo, requerer asilo e submeter-se ao governo e autoridade legitimamente imposta nesse Estado. Ademais, Grotius estabeleceu a diferenciação entre ofensas políticas e ofensas comuns, vinculando-as à posição de que só se deveria conceder asilo às pessoas perseguidas por ideais políticos e ou religiosos[21].

No século XVIII reinavam os ideais liberais e os revolucionários que tinham o objetivo de limitar o poder do soberano a fim de que qualquer um pudesse gozar plenamente da própria liberdade.

Nesse contexto se encontra o embrião do conceito moderno de asilo político que foi, pela primeira vez, proclamado numa constituição européia, ou seja, na Constituição Republicana Francesa de 24 de Junho de 1793, a qual subscreve, no seu artigo 120º, que o povo francês “Il donne asile aux étrangers bannis de leur patrie pour la cause de la liberté. - Il le refuse aux tyrans[22].

Desse artigo emerge claramente uma mudança súbita da idéia de asilo:

innanzi tutto esso non è più limitato ad un luogo specifico, ma si estende a tutto il territorio nazionale, inoltre si restringe notevolmente il dominio di applicazione dello stesso, specificando in modo inequivocabile a chi esso sia diretto: si rivolge infatti ai soggetti che fuggono dalla loro patria “per la causa della libertà”, non più quindi a chiunque, e specialmente non più ai criminali [23] .

Como visto acima, somente poderia receber a proteção do povo francês e, então, do Estado, aquela pessoa que esteja sendo perseguida injustamente por sua ação política em defesa da liberdade, devendo o asilo ser negado aos “tiranos”, ou seja, àqueles que são a causa da opressão das liberdades. O direito de asilo deixa de ser um direito humano individual e passa a ser um direito do Estado de acolher ou não um estrangeiro requerente de asilo.

No século XIX, os ideais propostos por Grotius vão, gradualmente, ganhando consistência na comunidade internacional e passam a ser aceitos pelos Estados Nacionais, de modo que, paulatinamente, as pessoas requerentes de asilo que tivessem praticado graves crimes comuns eram entregues aos Estados onde os mesmos foram praticados[24]. Naquele século, a palavra asilo foi largamente utilizada para as pessoas requerentes de asilo pela prática de crimes políticos. Vigorava, portanto, o princípio da não extradição, exceto se as ofensas políticas cometidas fossem contra os chefes de Estado[25].

Com o desenvolvimento do Estado-nação como uma entidade precisa e com soberania sobre o seu território e tudo aquilo que se encontra nele, inclusive pessoas, o significado de direito de asilo mudou radicalmente. Ou seja, se originalmente o direito de asilo era próprio do indivíduo, com as transformações decorridas com o tempo, torna-se um direito exclusivo do Estado que, como hoje, pode concedê-lo ou não. O asilo tornou-se um instrumento para proclamar a identidade e a soberania do Estado.

Nesse período o direito de asilo enriqueceu-se do elemento político, elemento que vamos encontrar também na definição de refugiado do artigo primeiro da Convenção de Genebra relativa ao status de refugiado de 1951, momento no qual “i due concetti vengano a compenetrarsi e confondersi”.[26].

1.1.3 Direito de asilo, asilo político e refúgio

No século XX, com dois conflitos mundiais, com as migrações em massa conseqüentes da guerra e do extermínio nazista, e com a difusão do paradigma dos direitos humanos, a atenção dos Estados focaliza-se decisivamente em direção ao conceito de Direito de Asilo, “con cui si vanno a confondere e su cui vanno ad innestarsi i diritti dei rifugiati [27].

Isso, todavia, vem amiúde presumido como sabido e assimilado pelo direito dos refugiados, como denota o fato de que o termo asylum-seeker [28] seja comumente utilizado para designar aquele que apresentou demanda pelo status de refugiado e está à espera dessa decisão e para o qual o reconhecimento do status de refugiado seria, então, suficiente para o fim de obter o asilo, em seu sentido amplo.

O costume internacional consolidou a prática da concessão do asilo pelos Estados nacionais. Entretanto, a comunidade internacional carecia, ainda, de um corpus normativo. Essa normatização surge com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, aprovada no âmbito das Nações Unidas. A Declaração, fruto de um esforço sistemático em educar os povos para a proteção dos direitos humanos, fundou-se inspirada na Revolução Francesa, nos seus princípios de liberdade, igualdade, fraternidade e solidariedade. Conforme seu artigo 14:

1. Everyone has the right to seek and to enjoy in other countries asylum from persecution

2. This right may not be invoked in the case of prosecutions genuinely arising from non-political crimes or from acts contrary to the purposes and principles of the United Nations [29] .

A Declaração Universal da ONU veio coroar essa prática vigente na sociedade internacional, tornando-a um parâmetro de atuação dos Estados, não os obrigando, no entanto, a conceder o asilo[30]. Mello corrobora essa afirmação: “Não existe qualquer obrigatoriedade do Estado em conceder o asilo. A sua concessão é um ato discricionário do Estado asilante. O asilo é um direito do Estado, e não do indivíduo”[31].

Já no entender de Piovesan, a Declaração assegurara o direito de asilo como direito fundamental de todos os seres humanos que são perseguidos. Para ela, o advento dos termos da Declaração constitui-se um grande avanço, como se pode ver nas suas palavras:

ao enfocar-se os contornos do direito de asilo, percebe-se que a Declaração assegura o direito fundamental de toda pessoa de estar livre de qualquer forma de perseguição. Consequentemente, na hipótese de perseguição decorre o direito fundamental de procurar e gozar asilo em outros países. A perseguição a uma pessoa caracteriza grave violação aos direitos humanos. Vale dizer, cada solicitação de asilo é resultado de um forte padrão de violência a direitos universalmente garantidos[32].

Sendo assim, o asilo revela-se como regra geral, ampla, com a finalidade de proteger todas as pessoas que são ou podem ser perseguidas.

The word “asylum” is not defined in international law; but it has become an umbrella term for the sum total of protection provided by a country to refugees on its territory. Asylum means, at the very least, basic protection - i.e., no forcible return (refoulement) to the frontiers of territories where the refugee’s life or freedom would be threatened - for a temporary period, with the possibility of staying in the host country until a solution outside that country can be found. In many countries it means much more, incorporating the rights set out in the 1951 Convention and even going far beyond those [33] .

Ou seja, conforme ACNUR, asilo é uma concessão por parte do Estado de proteção em seu território a pessoas de outros Estados que fogem por temor de perseguição ou perigo grave. Uma pessoa a quem se concede o asilo converte-se em refugiado. A noção de asilo engloba uma série de elementos entre os quais a não devolução, permissão para permanecer no território do país de acolhida e normas relativas ao trato humano[34].

O sistema edificado pelas Nações Unidas trata da condição de refugiado e não do refúgio. Nesse sistema também se encontra a figura do asilo, prevista para refugiados reconhecidos, como o país onde poderão residir e prosseguir suas vidas, bem como o conceito de proteção, que engloba a busca de acesso ao procedimento de determinação da condição de refugiado, ao reconhecimento propriamente dito e à obtenção de residência em algum país. Portanto, não se pode afirmar que alguém que esteja sofrendo perseguição almeje ser “reconhecido como refugiado”, mas, o que a pessoa busca é a proteção do asilo[35].

Apesar dessa acolhida a estrangeiros perseguidos ser amplamente difundida e praticada, houve a necessidade de positivá-la a fim de torná-la um instituto ainda mais eficaz e efetivo na proteção das pessoas em âmbito internacional. No momento dessa positivação, estabeleceu-se o “direito de asilo” (asilo lato sensu) [36] . E foi a partir do fim do século passado que se teve o desmembramento normativo do gênero “asilo” em duas espécies: asilo político e refúgio.

No continente americano, desenvolveu-se um estatuto jurídico próprio, aplicável pelos países da região aos chamados asilados políticos[37]. Por tais razões, criou-se, também, uma certa confusão material entre o âmbito de um e de outro, sem contar as dificuldades conceituais, motivo pelo qual diversos autores preferem tratar autonomamente e manter separados os dois institutos[38]. Nesse sentido, parece interessante recordar que somente na América Latina se faz essa suposta diferenciação entre conceitos e sistemas, pois no resto do mundo fala-se de asilo e solicitante de asilo para identificar o status de refugiado e não de asilado político. Por exemplo, na língua inglesa são utilizados os termos, refugee, asylum e asylum seekers, e em francês, réfugié , asile e demandeurs d’asile.

Cumpre ressaltar que, para alguns estudiosos do tema, não há distinção entre asilo e refúgio. Tal posicionamento é encontrado na maioria dos Estados, principalmente os de cultura anglo-saxã. Para adeptos da unidade dos institutos, tem-se que as pessoas que buscam asilo são todos que deixam seu país de origem e/ou residência habitual e buscam proteção de outro Estado em função de fundado temor de perseguição. A proteção concedida a todos seria a do asilo[39].

Portanto, ao contrário da América Latina, para os Estados europeus, o asilo político é considerado uma afronta à soberania na medida em que permite aceitar como asilado político pessoas que tenham cometido crimes políticos, o que configura uma causa de exclusão na concessão de refúgio.

A América Latina foi palco do desenvolvimento regional do direito de asilo, na sua forma de asilo político. Diversos fatores explicam o desenvolvimento do direito de asilo no continente americano, mas, preponderantemente, são os conflitos políticos internos e a instabilidade dos governos que propiciam a riquíssima história do asilo na sua vertente latina. Foi um direito construído sob a base de tratados, sem que nenhuma instituição de caráter intergovernamental fosse criada para implementar tais tratados[40].

Em essência, tanto o sistema latino-americano de asilo político como o Direito de Asilo (asilo lato sensu) caracterizam-se por ser uma proteção concedida por um Estado “frente al ejercicio de la jurisdicción del Estado de origen; basada en el principio de la no devolución y caracterizada por el cumplimiento de los derechos internacionales reconocidos a los refugiados[41]. Em ambos os sistemas, o indivíduo é amparado ou protegido de uma possível extradição, expulsão ou devolução ao Estado onde se deu a perseguição ou onde ela pode produzir-se[42].

Na América Latina, o asilo político foi codificado em inúmeros tratados regionais, como o Tratado de Direito Penal Internacional de Montevidéu de 1889 (que dedica um capítulo a ele), a Convenção sobre Asilo de Havana de 1928, a Convenção sobre Asilo Político de Montevidéu de 1933, o Tratado sobre Asilo y Refugio Políticos de Montevidéu de 1939 e as Convenções sobre Asilo Diplomático e Territorial de Caracas de 1954. Conforme o artigo II da Convenção de Caracas:

el respeto que según el Derecho Internacional se debe a la jurisdicción de cada Estado sobre los habitantes de su territorio se debe igualmente, sin ninguna restricción, a la [jurisdicción] que tiene sobre las personas que ingresan con procedencia de un Estado en donde sean perseguidas por sus creencias, opiniones o filiación política o, por actos que puedan ser considerados como delitos políticos [43] .

Segundo Gross Espiell, na América Latina, conforme o disposto nessas Convenções, “asilo territorial y refugio son absolutamente sinónimos, pero el asilo territorial (o el refugio) latinoamericano no son conceptos idénticos al de refugiados según la Convención de 1951 y el Protocolo de 1967” [44], porque ampliam o conceito de refugiado (ou, nesse caso, asilado). Para Santiago, a clara distinção entre asilo diplomático e asilo territorial aparece a partir do tratado de Montevidéu de 1939, “cuyos 10 primeros artículos están dedicados al asilo diplomático o político, en tanto los artículos 12 a 15 tratan del ‘asilo territorial’ (denominado simplemente ‘asilo’) o refugio dado en territorio extranjero [45] /[46] ”. Como se pode ver, nessa época, o asilo político era considerado sinônimo do asilo diplomático, enquanto o asilo territorial era um sinônimo de refúgio.

Atualmente, o asilo político pode assumir duas formas: o asilo territorial[47], concedido quando o indivíduo se encontra no território do Estado ao qual solicita proteção; e o asilo diplomático[48], concedido em extensões do território do Estado solicitado (embaixadas, navios, aeronaves, etc.), portanto a pessoa ainda está no território do país no qual sofre a perseguição. Em resumo, na América Latina, “asilado político será quien con arreglo a la calificación del Estado requerido, sea perseguido por delitos políticos o por delitos comunes cometidos con fines políticos[49].

Piovesan diferencia refúgio de asilo político ao considerar traços distintivos entre esses institutos. Segundo ela, o refúgio é uma “medida essencialmente humanitária”, contempla motivos raciais, de nacionalidade, religiosos, de grupo social e de opiniões políticas, bastando fundado temor de perseguição (já que esta não precisa ter ocorrido efetivamente), aplica-se fora do país de origem, apresenta cláusulas de cessação, perda e exclusão. Por sua vez, o asilo político é uma “medida essencialmente política”, abarca crimes de natureza política, além de exigir efetiva perseguição[50], pode ser aplicado no país de origem (no caso do asilo diplomático) e não apresenta quaisquer cláusulas de exclusão, o qual, na atualidade, só continua sendo utilizado na América Latina.

Mesmo sendo diferentes, ambos têm o mesmo objetivo que é a proteção da pessoa humana. Logo, no lugar de se negarem, eles se completam em um só corpo de proteção: o Direito de Asilo (asilo lato sensu). Portanto, não se deve confundir o refugiado com o asilado político latino-americano, principalmente pelo fato que, na condição de asilado político, são aceitos indivíduos que sejam perseguidos por delitos políticos ou por delitos comuns cometidos com fins políticos, enquanto estes são considerados motivos de exclusão de alguém que esteja solicitando refúgio. Assim como não se deve confundir o asilo político, em seus moldes latino-americanos, com o Direito de Asilo, ou seja, o asilo lato sensu. E, por fim, não se pode afirmar que alguém que esteja sofrendo perseguição almeje ser “reconhecido como refugiado”. O que a pessoa busca é a proteção do asilo. O reconhecimento da condição de refugiado é, sim, um meio que pode conduzir ao asilo, que é o fim do pedido de proteção internacional[51].

1.2 A consolidação do Instituto do Refúgio

A implementação do Instituto do Refúgio deu-se, num primeiro momento, por meio das atividades da Liga das Nações. A partir desse marco histórico, Fischel de Andrade divide essa primeira fase do estudo dos refugiados, de 1921 a 1951, em duas[52]. A primeira compreende o período de 1921 a 1939, no qual o conceito observava o grupo étnico ou nacional a que o refugiado pertencia (elemento objetivo), sendo ele, por conceituação, definido como membro de um determinado grupo de pessoas perseguidas em seu estado de origem. A segunda fase, de 1938 a 1951, caracteriza-se pela perspectiva individualista daquele que buscava proteção (elemento subjetivo), na qual o fator determinante para a análise da situação de refugiado era “baseado na necessidade de proteger as pessoas, independente de qualquer definição de grupo, mas que de alguma forma, tinham sido afetadas por um evento político ou social”[53].

Já, segundo Hataway[54], a implementação do Instituto do Refúgio deu-se em três momentos, os quais ele define de acordo com as abordagens jurídica, social e individualista. Sua proposta divide a perspectiva de grupo étnico ou nacional em duas abordagens: jurídica e social. Utilizar-se-á, portanto, a proposta de Hataway por ser mais específica quanto aos grupos de pessoas perseguidas em seus estados de origem, pois, na fase jurídica, tais grupos recebem um reconhecimento jurídico e, na fase social, assistência internacional, principalmente aos perseguidos pelo Nazismo.

Portanto, conforme Hataway, a instituição do refúgio deu-se por meio de trêsfases: the juridical approach of 1920-1935 (abordagem jurídica), caracterizada pelo reconhecimento com base no pertencimento do indivíduo a determinado grupo que necessitasse proteção; the social approach of 1935-1939 (abordagem social), caracterizada por prover assistência internacional para determinados grupos de refugiados em decorrência de acontecimentos políticos e sociais, principalmente relacionados ao Nazismo; the individualist approach of 1938-1950 (abordagem individualista), caracterizada pelo exame dos méritos do caso de cada solicitante de asilo[55].

1.2.1 Perspectiva coletiva, de grupo étnico ou nacional

Essa perspectiva compreende o período de 1921 a 1939, quando os refugiados eram definidos coletivamente por serem parte de determinado grupo étnico ou nacional. Como já visto, Hataway divide a perspectiva coletiva, em abordagem jurídica e abordagem social, as quais serão expostas nos próximos dois itens.

1.2.1.1 Abordagem jurídica (1920-1935)

A aparição dos refugiados como fenômeno de massa teve lugar no final da Primeira Guerra Mundial, com as quedas dos impérios russo, austro-húngaro e otomano e a nova ordem criada pelos tratados de paz que alteraram profundamente as bases territoriais da Europa centro-oriental.[56]

Segundo Arendt, a Primeira Guerra

foi uma explosão que dilacerou irremediavelmente a comunidade dos países europeus, como nenhuma outra guerra foi capaz, fazendo com que a inflação, desemprego e guerras civis sobreviessem e se alastrassem durante os seguintes anos de ‘paz agitada’, que culminaram na migração de densos contingentes humanos que não eram bem-vindos e não podiam ser assimilados em parte alguma. Uma vez fora do país de origem, permaneciam sem lar; quando deixavam o seu Estado, tornavam-se apátridas; quando perdiam os seus direitos humanos, perdiam todos os direitos: eram o refugo da terra[57].

O término da Primeira Guerra Mundial, no entanto, modificou em escala numérica inédita o padrão de pessoas que não eram bem-vindas a lugar algum e que não podiam ser assimiladas por parte alguma. Como observa Arendt, essas pessoas se converteram no “refugo da terra”, pois quando perderam seus lares, sua cidadania e seus direitos se viram expulsos do seu país. Em pouco tempo, foram deslocados de seus países 1.500.000 russos brancos[58], 700.000 armênos, 500.000 búlgaros, 1.000.000 de gregos e milhares de alemães, húngaros e romenos. A essas massas em movimento tem-se que acrescentar a situação explosiva determinada por cerca de 30% das populações dos novos organismos estatais criados por tratados de paz conforme o modelo do Estado-nação (por exemplo, Iugoslávia e Tchecoslováquia), que constituíam minorias que tiveram que ser tuteladas por meio de uma série de tratados internacionais, chamados Minority Treaties.[59]

Ao final da Primeira Guerra, as potências ocidentais tentaram prover os direitos elementares das minorias étnicas que estavam ameaças em decorrência do redesenho das fronteiras nacionais por meio de uma série de Tratados de Minorias. Entretanto, com a deteriorização da situação econômica global que sucedeu a recuperação do início do pós-guerra, rapidamente as minorias se tornaram culpadas de tudo. “Governments defined broad categories of people as belonging to the nation-state and relegated others to the ranks of outsiders and aliens who threatened national and cultural cohesion[60]. Muitos grupos minoritários nacionais foram imediatamente naturalizados pelos seus novos países, mas alguns grupos não tiveram esse privilégio.

Para Arendt,

a verdadeira importância dos tratados de minorias não está em sua aplicação prática, mas no fato de que eram garantidos por uma entidade internacional, a Liga das Nações. Minorias haviam existido antes, mas a minoria como instituição permanente, o reconhecido de que milhões de pessoas viviam fora da proteção legal normal e normativa, necessitando de uma garantia adicional dos seus direitos elementares por parte de uma entidade externa, e a admissão de que este estado de coisas não era temporário, mas que os tratados eram necessários para criar um modus vivendi duradouro(...)[61].

O caso dos refugiados russos deve ser, ainda, salientado por outro aspecto: o número de apátridas viu-se multiplicado por uma prática política[62], fruto de atos do Estado no exercício da competência soberana em matéria de imigração, naturalização e nacionalidade. A desnaturalização em massa por motivos políticos foi caminho inaugurado pelo governo russo[63] pelos decretos de 28 de outubro e 15 de dezembro de 1921, os quais retiravam a nacionalidade russa daqueles que se encontravam no exterior há mais de 5 anos e, até 22 de junho de 1922, não houvessem obtido o passaporte das novas autoridades ou, ainda, houvessem abandonado a Rússia depois da revolução, em razão de sua discordância com o regime que passou a vigorar[64]. Portanto, antes de se tornarem refugiados, foram, em um primeiro momento, apátridas.

Em 1921, a Liga das Nações, juntamente com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha[65] /[66], produziu a primeira organização oficial para a proteção de refugiados, o Alto Comissariado para Refugiados Russos[67], com o objetivo de socorrer os quase 2 milhões de russos que foram obrigados a deixar seu país após a Revolução Russa. A função desse organismo era definir a situação jurídica dos refugiados, repatriá-los ou levá-los a assentamentos. Esse Comissariado era coordenado pelo Delegado do Governo da Noruega na Sociedade das Nações, Fridtojf Nansen[68], que conseguiu sensibilizar a comunidade internacional a fim de tratar de encontrar uma solução permanente para o problema dos refugiados.

Inicialmente, Nansen estava envolvido com os problemas práticos dos refugiados russos e, em particular, com os problemas dos refugiados que necessitavam viajar. Entretanto, esses eram problemas extremamente complexos e não podiam ser resolvidos rapidamente. A maioria simplesmente não podia retornar para casa, tampouco assentar-se espontaneamente na Europa, nem viajar para a América do Norte ou algum outro destino ultra-marinho de imigração[69].

Em 5 de julho de 1922, sob os auspícios do Alto Comissariado para Refugiados Russos, foi ratificado por 52 países, em Genebra, o Ajuste Relativo à Expedição de Certificados de Identidade para os Refugiados Russos[70] /[71]. Esse acordo não definiu de forma definitiva o que deveria se entender por refugiado russo, porém instituiu o Certificado de Identidade para Refugiados Russos, idealizado pelo comissário Fridtjof Nansen, que ficou conhecido como Passaporte Nansen destinado a dar aos refugiados russos um status jurídico, identificá-los e permitir aos que se refugiavam viajar sobre o território dos países que os reconheciam e retornar ao país que havia expedido o documento. Foi um primeiro passo para dar aos refugiados a possibilidade de começar uma nova vida e radicar-se.

At first, the High Commissioner's staff attempted to protect them by providing consular services and diplomatic interventions with host governments that threatened their expulsion and deportation. Finally, through skillful diplomacy, Nansen tackled the problem head-on by persuading fifty-one governments to recognize travel documents termed "Nansen passports" for stateless Russians. With these documents, not only Russian refugees but also others could legally move from areas where their stays were temporary and often illegal to more hospitable areas in Europe and elsewhere. [72]

Em 31 de Maio de 1924, o mandato do Alto Comissariado para os Refugiados Russos foi ampliado para proteger os armênios, vítimas do primeiro grande genocídio do século XX[73]. Por intercessão do Dr. Nansen, nesse ano, foi assinado entre 35 nações, inclusive o Brasil, o Plano Relativo à Expedição dos Certificados de Identidade para os Refugiados Armênios, que objetivava estender o sistema de proteção jurídica para os 300 mil armênios que fugiam do genocídio e que se encontravam espalhados pela Síria, Iraque, Chipre, Palestina, Grécia, Bulgária e por outros países europeus. Desde então, os armênios tiveram o direito de portar o Passaporte Nansen e passaram a ser conhecidos, juntamente com os russos, como refugiados Nansen[74].

Em 12 de maio de 1926, foi celebrado o Arrangement relating to the issue of identity certificates to Russian and Armenian refugees para definir quem eram os refugiados russos e armênios[75].

Como já descrito, as primeiras definições do conceito de refugiado centravam-se em dar uma definição jurídica a determinado grupo étnico ou nacional à qual o refugiado pertencia, como por exemplo as definições adotadas pelo acordo de 1926:

Russian: Any person of Russian origin who does not enjoy or who no longer enjoys the protection of the Government of the Union of Socialist Soviet Republics and who has not acquired another nationality.

Armenian: Any person of Armenian origin formerly a subject of the Ottoman Empire who does not enjoy or who no longer enjoys the protection of the Government of the Turkish Republic and who has not acquired another nationality [76] .

Ademais, em 1928, começa a constituir-se, em âmbito internacional, o princípio do non-refoulment [77] , por meio do Arrangements relating to the legal status of Russian and Armenian refugees of 30 June 1928, no qual, pela primeira vez, esse princípio aparece em um instrumento jurídico de Direito internacional, ainda que de forma incipiente [78] . Para Fischel de Andrade, trata-se do “embrião do princípio de non-refoulement”, pois recomendava que a expulsão fosse suspensa ou não realizada caso o refugiado não reunisse condições legais para adentrar no país para onde se daria a condução[79].

Em 1930, Nansen morre e, durante os próximos 10 anos, o regime internacional dos refugiados que ele havia estabelecido e liderado tornou-se totalmente incapaz de lidar com os problemas dos refugiados judeus[80]. Ainda em 1930, as responsabilidades envolvendo a proteção dos refugiados foram colocadas sob a égide do Secretariado da Liga das Nações, enquanto a responsabilidade pela administração dos demais programas de assistência foi transferida para uma agência que se tornou conhecida como o Escritório Nansen[81].

Em 1933, abriram-se as assinaturas para a Convenção Relativa ao Estatuto Internacional dos Refugiados[82], elaborada pelo Escritório Nansen. Essa convenção visou ampliar praticas de repatriação e conceder aos refugiados russos e armênios direitos nos seus países de asilo[83].

Alguns dos aspectos mais relevantes da Convenção diziam respeito a questões de ordem administrativa, situação jurídica e condições para o trabalho. Segundo Loescher, “a number of rights to which refugees were entitled were specified, including education, employment in the receiving country, and travel documents” [84] .

No tocante ao conceito de refugiado, o artigo 1º regrava que

the present Convention is applicable to Russian, Armenian and assimilated refugees, a s defined by the Arrangements of May 12th, 1926, and June 30th, 1928, subject to such modifications or amplifications as each Contracting Party may introduce in this definition at the moment of signature or accession.[85].

O grande legado da Convenção de 1933 divide-se em dois pontos que merecem destaque: primeiro, a continuidade dada à essência de proteção aos refugiados, ou seja, não houve qualquer restrição na qualificação dos refugiados, pois a utilização da expressão “assimilados” abriu possibilidades maiores do que o até então concebido; segundo, a ampliação do âmbito e solidificação do princípio de non-refoulment, pois, no art. 3º dessa Convenção, encontra-se a obrigação de não repelir em qualquer hipótese, aqueles que, porventura, necessitem de proteção internacional[86].

1.2.1.2 Abordagem social (1935-1939)

A situação dos refugiados judeus alemães e o êxodo promovido em razão da política atroz e anti-semita adotada pelo governo nazista de Adolf Hitler, que assumiu o poder em 30 de janeiro de 1933, foi se tornando cada vez pior. Após as desnaturalizações maciças do regime nazista[87], iniciadas pela lei de 14 de julho de 1933, os judeus passaram a ser perseguidos em toda a Alemanha, se tornando cidadãos de segunda classe e perdendo todos os seus direitos, além disso, as desnaturalizações alcançaram um grande número de judeus e imigrados políticos residentes fora do Reich[88].

[...]


[1] Optou-se reportar o texto das citações na língua original da fonte, porque como diz o provérbio italiano “traduttore, traditore”. Assim, busca-se oferecer àqueles que têm o conhecimento do idioma da citação, desfrutar do texto original da fonte pesquisada. Ao mesmo tempo, àqueles que não têm conhecimento da língua terão as nota de roda pé com a tradução livre das citações.

[2] “ninguém quer saber que a história contemporânea criou uma nova classe de seres humanos: a classe daqueles que são confinados em campos de concentração por seus inimigos e em campos de internamento por seus amigos” (Tradução livre). ARENDT, H. Nosotros los refugiados (1943). In: ___. Una revisión de la história judia y otros ensayos. Buenos Aires: Paidós, 2006, p. 3.

[3] RODRIGUES, José Noronha. A História do Direito de Asilo no Direito Internacional. CEEAplA WP Nº18/2006. Ponta Delgada(Portugal): Centro de Estudos de Economia aplicada do Atlântico. Out/2006.

[4] ACNUR (UNHCR). Refugiados: legislación y estándares internacionales básicos. Ciudad de Mexico: Oficina Regional del ACNUR para México, Cuba y América Central, 2005d.

[5] ASYLUM. In: Origins: A Short Etymological Dictionary of Modern English. 2008. Disponível em: <http://www.bookrags.com/tandf/asylum-tf/>. Acesso em: 02 Jul. 2008. Ver Também: ASYLUM. In: MyEtymology.com. 2008. Disponível em: < http://www.myetymology.com/latin/asylum.html>. Acesso em: 4 mar. 2009; ASYLUM. In: THE OXFORD POCKET DICTIONARY OF CURRENT ENGLISH. 2009. Encyclopedia.com. Disponível em: <http://www.encyclopedia.com/doc/1O999-asylum.html>. Acesso em: 4 mar. 2009.

[6] SÉGUR, Philippe. La crise du droit d’asile. Paris: Presse Universitaires de France, 1998; CREPEAU, François. Droit d’asile: de l’hospitalité aux contrôles migratoires. Bruxelles: édition Bruylant, édition de l’Université de Bruxelles, 1995.

[7] SÉGUR, op. cit. , 1998.

[8] O asilo laico é uma concessão do Estado soberano e, portanto, das leis do homem.

[9] BONAMINI, Claudia. Lo s tatus di rifugiato Nell’Unione Europea. 2003-2004. Tesi di Laurea - Università Degli Studi Di Padova. Facoltà di Scienze Politiche. Indirizzo Politico-Internazionale. Padova, 2003-2004.

[10] SÉGUR, op. cit. , 1998.

[11] É considerado o mais importante código de leis da Idade Média e a maior compilação legislativa desde os tempos de Roma. Criada por D. Affonso III, o Sábio, que, no intento de unificar o direito na Espanha, mandou elaborar um código intitulado Lei das Sete Partidas, redigido entre 1256 e 1263 sob orientação do próprio soberano por um grupo de jurisconsultos da Universidade de Salamanca, da qual foi fundador. A Lei era composta de Sete Livros: 1º) Código Canônico: definia obrigações do clero e as questões de dogma. Exceção feita ao Título I da lei, que a definia, determinava quem tinha poderes para fazer leis e quais deveriam ser suas motivações, quem tinha poderes para emendá-las, etc; 2º) Imperadores, Reis e Outros Lordes: definia as prerrogativas, direitos e deveres dos governantes; 3º) Justiça e sua Administração; 4º) Leis sobre matrimônio, parentesco, situação das crianças legítimas e ilegítimas, adoção, direitos paternos, escravidão e liberdade, suserania; 5º) Lei Comercial: empréstimos do governo, dívidas, contratos, compras, trocas, feiras, mercados, marinha mercantil, e todas as outras formas de comércio e transações comerciais entre os homens; 6º) Testamentos, Heranças, Guarda de órfãos ou menores; 7º) Lei Criminal: crimes, calúnia, penalidades, punições, indenizações. Leis para administração dos Judeus, Mouros e Heréticos. Cf.: MADEIRA, Hélcio Maciel França. Introdução a História do Direito Português. Disponível em: <http://helciomadeira.sites.uol.com.br/hd2_arquivos/Almeida_IHDP.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2008.

[12] RODRIGUES, op. cit., 2006, p. 5.

[13] SÉGUR, op. cit. , 1998.

[14] FISCHEL DE ANDRADE, José Henrique. Breve reconstituição histórica da tradição que culminou na proteção internacional dos refugiados. In: ARAÚJO, Nádia de; ALMEIDA, Guilherme Assis de (Coord.). O direito internacional dos refugiados: uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro; São Paulo: Renovar, 2001a, p. 99-125, p.105.

[15] RODRIGUES, op. cit., 2006, p. 6.

[16] Salvaguardadas as devidas diferenças geopolíticas, históricas e culturais, entre outras, desde o Luteranismo ao Calvinismo e Anglicanismo.

[17] HATHAWAY, James. C. A Reconsideration of the Underlying Premise of Refugee Law . Harvard International Law Journal. Boston, v. 31, n.1, 1990, p. 129-147.

[18] FISCHEL DE ANDRADE, José Henrique. Direito internacional dos refugiados: evolução histórica 1921-1952. Rio de Janeiro: Renovar, 1996b, p. 14.

[19] RODRIGUES, op. cit., 2006.

[20] HATHAWAY, op. cit., 1990.

[21] RODRIGUES, op. cit., 2006.

[22] “[...]dá asilo aos estrangeiros banidos da sua pátria pela causa da liberdade. Recusa-o aos tiranos” (Tradução livre). Cf.: FRANCE. La Constitution du 24 juin 1793 . Disponível em: < http://www.aidh.org/Biblio/Text_fondat/FR_04.htm>. Acesso em 14 out. 2008. Ver também: SÉGUR, op. cit., 1998.

[23] “Primeiramente, ele não é mais limitado a um lugar específico, mas se estende a todo o território nacional, ademais se reduz notavelmente o domínio de aplicação do mesmo, especificando de maneira inequívoca a quem ele seja direito: se refere aos indivíduos que fogem da sua pátria ‘pela causa da liberdade’, não mais qualquer um, especialmente não mais aos criminosos” (Tradução livre). Cf.: BONAMINI, op. cit., 2003-2004, p. 16.

[24] RODRIGUES, op. cit., 2006.

[25] FISCHEL DE ANDRADE, op. cit., 2001a.

[26] “Os dois conceitos vêm a imbricar-se e confundir-se” (Tradução livre). Cf.: BONAMINI, op. cit., 2003-2004, p. 15.

[27] “com os quais se vão confundir e sobre os quais vão ser construídos os direitos dos refugiados” (Tradução livre). Cf.: BONAMINI, op. cit., 2003-2004, p. 19.

[28] Segundo ACNUR, Asylum-seeker (ou solicitante de asilo) é aquela pessoa a qual requeriu asilo, que ainda não obteve a decisão final por parte do país que poderá dar-lhe ou não o status de refugiado. Cf.: ACNUR (UNHCR). Refugee Protection: A Guide to International Refugee Law. Geneva: Office of the United Nations High Commissioner for Refugees, 2001b, p. 125.

[29] “1. Toda pessoa vítima de perseguição tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países. 2. Esse direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crime de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas”(Tradução livre). Cf.: UNITED NATIONS GENERAL ASSEMBLY. Universal Declaration of Human Rights, 10 December 1948. Disponível em: <http://www.unhcr.org/refworld/docid/3ae6b3712c.html>. Acesso em: 12 abr. 2008.

[30] MONTEIRO, Lara. Aspectos Históricos e Contemporâneos acerca da Proteção Internacional dos Refugiados. In: Revista Eletrônica de Direito Internacional . Belo Horizonte, ano 1, n. 1, p. 597-637, 2007.

[31] MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. Renovar: Rio de Janeiro, 2004, p.1101.

[32] PIOVESAN, Flávia. O direito de asilo e a proteção internacional dos refugiados. In: ARAÚJO, Nádia de; ALMEIDA, Guilherme Assis de (Coord.). O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p.30.

[33] “A palavra asilo não é definida no Direito Internacional; mas ela tem se tornado um termo “guarda-chuva” para a soma total de providências de proteção provida por um país aos refugiados em seu território. Asilo significa, no mínimo, proteção básica – isto é – não forçar o retorno (refoulement) para as fronteiras dos territórios onde a vida dos refugiados ou liberdade podem ser ameaçadas – por um período temporário, com a possibilidade de permanecer no país hospedeiro, até que uma solução venha ser encontrada. Em muitos países isso significa muito mais, a incorporação dos direitos propostos na Convenção de 1951 e até mesmo mais além desses” (Tradução livre). Cf.: ACNUR (UNHCR), op. cit,, 2001b, p.15.

[34] Id. Ibid.

[35] SODER, Rodrigo Magnus. O direito de asilo na União Européia um olhar normativo sobre a Europa-fortaleza. 2007. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Direito. Programa de Pós-Graduação em Direito, Porto Alegre, 2007, p. 12.

[36] JUBILUT, Liliana Lyra. O Direito Internacional dos Refugiados e sua Aplicação no Ordenamento Jurídico Brasileiro. São Paulo: Método, 2007, p. 37.

[37] FISCHEL DE ANDRADE, op. cit., 2001a.

[38] SODER, op. cit., 2007.

[39] JUBILUT, op. cit., 2007.

[40] SODER, op. cit., 2007.

[41] “frente ao exercício da jurisdição do Estado de origem; baseado no princípio de não devolução e caracterizada pelo cumprimento dos direitos internacionais reconhecidos aos refugiados” (Tradução livre). Cf.: AITCHISON, Jean, Tesauro internacional de terminología sobre refugiados. San José, Costa Rica: IDDH e ACNUR, 1991, p. 37.

[42] FERNANDEZ, Jaime Esponda. La tradición latinoamericana de asilo y la protección internacional de los refugiados. In: FRANCO, Leonardo (Coord.). El asilo e la protección internacional de los refugiados en América Latina. San José: Editorama, 2004, p.79-125.

[43] “O respeito que se deve, segundo o Direito Internacional, à jurisdição de cada Estado sobre os habitantes do seu território, se deve igualmente, sem nenhuma restrição, à [jurisdição] que possui sobre as pessoas que ingressam com procedência de um Estado, no qual sejam perseguidas por suas crenças, opiniões ou filiação política ou por atos que possam ser considerados como delitos políticos” (Tradução livre). CONVENCION SOBRE ASILO TERRITORIAL DE CARACAS. Acesso em: <http://www.acnur.org/biblioteca/pdf/0037.pdf>. Acesso em 23 abr. 2008.

[44] “Asilo territorial e refúgio são absolutamente sinônimos, mas o asilo territorial (ou refúgio) latino-americano não são conceitos idênticos ao de refugiados segundo a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967” (Tradução livre). Cf.: GROSS ESPIEL, Héctor. El derecho internacional americano sobre asilo territorial y extradición en sus relaciones con la Convención de 1951 y el Protocolo de 1967 sobre el estatuto de los refugiados. In: ACNUR (UNHCR). Asilo y protección de refugiados en América Latina. Ciudad de Mexico: Universidad Autónoma de México, 1982, p. 33-81, p. 43.

[45] “Cujos 10 primeiros artigos dedicam-se ao asilo diplomático ou político, enquanto os artigos 12 a 15 tratam do asilo territorial (denominado simplesmente ‘asilo’) ou refúgio dado em território estrangeiro” (Tradução livre). Cf.: SANTIAGO, Jaime Ruiz de. La Declaración de Cartagena: Naturaleza jurídica y trascendencia histórica. In: Alto Comisionado de las Naciones Unidas para los Refugiados. Memoria del Vigésimo Aniversario de la Declaración de Cartagena sobre los Refugiados. San José: Editorama, 2005, p. 307-330, p.310.

[46] TRATADO SOBRE ASILO Y REFUGIO POLÍTICO DE MONTEVIDEO DE 1939. Disponível em <http://www.acnur.org/biblioteca/pdf/0608.pdf>. Acesso em: 23 abr. 2008.

[47] O asilo territorial foi regulamentado nesta região pela Declaração dos Direitos e Deveres do Homem sobre Asilo Territorial de 1948 e pela Convenção sobre Asilo Territorial de 1954.

[48] O asilo diplomático se refere à tradição em certos países, em particular na América Latina, que consiste em dar asilo a fugitivos políticos nas embaixadas estrangeiras. Embora estando fora da jurisdição do seu país, não se encontra fora do seu território e por isso não pode ser considerado de acordo com os termos da Convenção de 1951 e é tido, muitas vezes, como uma afronta à soberania do outro país.

[49] “Asilado político será quem em conformidade com a qualificação do Estado requerido, seja perseguido por delitos políticos ou por delitos comuns cometidos com fins político” (Tradução livre). Cf.: MESA NACIONAL PARA LAS MIGRACIONES, REPUBLICA DOMINICANA. Seminario sobre Asilo, Refugio y Non-Refoulement: a 20 años de la Declaración de Cartagena sobre Refugiados. Santo Domingo, Republica Dominicana: Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales (FLACSO), 2004, p. 43.

[50] PIOVESAN, op. cit., 2001, p. 57-58.

[51] SODER, op. cit., 2007, p. 12.

[52] FISCHEL DE ANDRADE, op. cit., 1996b.

[53] CARNEIRO, Wellington Pereira . As mudanças nos ventos e a proteção dos refugiados. In: Universitas: Relações Internacionais. Brasília, Vol. 3, N. 2, 2005, p.2.

[54] HATAWAY, James C. The Law of Refugee Status. Toronto: Butterworths, 1991.

[55] HATAWAY, op. cit., 1991, p. 2-5.

[56] AGAMBEN, Giogio. Al di là dei diritti dell’uomo. In: ___. Mezzi senza fini: note sulla politica. Torino: Bollati Boringhieri, 1996. p. 20-29.

[57] ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo. Anti-semitismo, imperialismo, totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 300.

[58] Os Russos Brancos eram partidários das forças contra-revolucionárias, durante a guerra civil russa. O exército branco compreendia algumas das forças russas, tanto políticas como militares, que se opuseram aos Bolcheviques após a Revolução de Outubro e lutaram contra o Exército Vermelho, assim como contra o Exército Verde nacionalista e o Exército Negro anarquista durante a Guerra Civil Russa de 1918 a 1921. A denominação Branco tem dois significados. Primeiro, colocava-se em oposição aos Vermelhos - o Exército Vermelho revolucionário que apoiava o Soviete e o Comunismo. Segundo, a palavra "branco" tem associações monarquistas: historicamente, cada Czar russo era chamado solenemente de czar branco, e o ideal monarquista durante a guerra civil era conhecido como a idéia branca. Cf.: REIS FILHO, Daniel Aarão; FERREIRA, Jorge; ZENHA, Celeste (org.). O século XX. O tempo das crises: revoluções, fascismos e guerras. Vol 2. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.

[59] AGAMBEN, op. cit., 1996.

[60] “Os governos definiram amplas categorias de pessoas como pertencentes aos Estados-nação e relegaram outras à condição de estranhos e alienígenas que ameaçavam a coesão cultural e nacional” (Tradução livre). Cf.: LOESCHER, Gil. Beyond Charity: International Co-operation and the Global Refugee Crisis. Oxford: Oxford University Press, 1993, p. 34.

[61] ARENDT, op. cit., 1989, p. 308.

[62] A partir da Primeira Guerra Mundial muitos Estados europeus começaram a introduzir leis de desnaturalização dos seus próprios cidadãos como, por exemplo, a França, em 1915, que promulgou lei de desnaturalização para os cidadãos naturalizados de origem “inimiga”; em 1921 a URSS, que passou a adotar tal medida em razão de sua discordância com o regime que passou a viger na Rússia foram desnacionalizados; em 1922, a Bélgica revogou a naturalização dos cidadãos que haviam cometidos atos anti-nacionais durante a guerra Cf.: AGAMBEN, op. cit., 1996. p. 20-29.

[63] Vale recordar aqui que a União das Reúblicas Socialistas soviéticas (URSS) foi constituída tão somente em 6 de julho de 1923. Cf.: FISCHEL DE ANDRADE, op. cit., 1996b, p. 37.

[64] Id. Ibid.

[65] Doravante, Cruz Vermelha.

[66] O Comitê Internacional da Cruz Vermelha, ou Movimento da Cruz Vermelha, é uma organização internacionalmente conhecida por sua atuação em situações de guerra. Trabalha para amenizar o sofrimento dos civis envolvidos em conflitos, principalmente fornecendo proteção, remédios e comida. Ao ajudar vítimas de guerra, a atuação da Cruz Vermelha recai sobre o domínio do Direito Internacional Humanitário, mas, como muitas vezes os conflitos bélicos geram refugiados, essa organização acaba, na prática, por assisti-los. Foi Idealizada por Henri Dunant, que tinha no internacionalismo o seu único objetivo, sendo aqui o internacionalismo entendido como a Europa sem fronteiras. Cf.: JUBILUT, op. cit., 2007, p. 74.

[67] Office of the High Commissioner for Russian Refugees (1921-1930).

[68] O Dr. Fridtjof Nansen (1861-1930), além de delegado da Noruega na Liga das Nações, era cientista e explorador, tendo-se aventurado a atravessar a Groenlândia, em 1888, alcançando, poucos anos depois, o ponto mais próximo do Pólo Norte. Em razão do seu profícuo trabalho humanitário, foi reconhecido com o Prêmio Nobel da Paz, em 1923, e o ACNUR condecora, até os dias de hoje, as pessoas que atuam a favor da proteção aos refugiados com a “Medalha Nansen”.

[69] LOESCHER, op. cit., 1993.

[70] Em inglês: Arrangements with regard to the issue of certificates of identity to Russian refugees of 5 July 1922.

[71] LEAGUE OF NATIONS. Arrangement With Regard to the Issue of Certificates to Russian Refugees, 5 July 1922. League of Nations, Treaty Series Vol. XIII No. 355. Disponível em: <http://www.unhcr.org/refworld/docid/3dd8b4864.html>. Acesso em: 23 abr. 2008.

[72] Em primeiro lugar, a equipe do Alto Comissariado visou protegê-los providenciando serviços consulares e intervenções diplomáticas com os governos hospedeiros que haviam ameaçado sua expulsão e deportação. Finalmente, através de hábil diplomacia, Nansen resolveu o problema diretamente ao persuadir cinqüenta e um governos a reconhecer os documentos chamados “Passaportes Nansen” para russos apátridas. Com esses documentos, não apenas os refugiados russos, mas também outros puderam mover-se legalmente de áreas onde suas estadias eram temporárias e frequentemente ilegais para áreas mais hospitaleiras na Europa e em outros lugares (Tradução livre). Cf.: LOESCHER, op. cit., 1993, p. 34.

[73] O genocídio armênio é considerado o primeiro grande genocídio do século XX e se constituiu na deportação e massacre de 1,5 milhão de armênios pelo Império Otomano, entre 1915 e 1923. Seus antecedentes remontam o século XI, quando uma série de invasões, migrações, deportações e massacres, reduziu os armênios, povo cristão, a uma população minoritária em seu território original, forçando inúmeros mercadores, personalidades religiosas e intelectuais a migrarem para a Índia, Rússia, Polônia e outros países do Leste Europeu. No século XV, os armênios restantes sobreviviam como camponeses, sob o domínio do Império Otomano, enquanto muitos outros eram artesãos e mercadores em Constantinopla, Esmirna, ou outras cidades menores. No século XIX, a idéia de independência voltou a ganhar força, mas no ano de 1909, o Império Otomano iniciou um massacre que fez vinte mil vítimas. Na Primeira Guerra Mundial, o Império Otomano estava em guerra com a Tríplice Entente, composta por Grã-Bretanha, Rússia e França e, como em todos os países beligerantes, cidadãos do sexo masculino foram convocados em massa. No caso otomano, por se tratar de um império com várias minorias nacionais hostis a Istambul, o recrutamento não foi bem recebido por muitas dessas minorias. Os armênios se rebelaram contra a guerra e contra a interminável opressão otomana. Foram reprimidos com um genocídio em massa; de acordo com fontes armênias, cerca de 1,5 milhão de pessoas foram humilhadas, deportadas, torturadas, estupradas e/ou mortas. Em 15 de abril de 1915, teve início uma operação programada de extermínio do povo armênio conduzida pelo governo dos Jovens Turcos, com prisões de líderes intelectuais e políticos, seguida pela deportação da população e da marcha pelo deserto da Mesopotâmia, onde brutalmente foram assassinados cerca de 1,5 milhão de uma população total de aproximadamente dois milhões de armênios. Cf.: AKÇAM, Taner. From Empire to Republic: Turkish Nationalism and the Armenian Genocide. London: Zed Books, 2004.

[74] FISCHEL DE ANDRADE, op. cit., 1996b.

[75] LEAGUE OF NATIONS. Arrangement Relating to the Issue of Identify Certificates to Russian and Armenian Refugees, 12 May 1926. League of Nations, Treaty Series Vol. LXXXIX, No. 2004. Disponível em: <http://www.unhcr.org/refworld/docid/3dd8b5802.html>. Acesso em: 23 abr. 2008.

[76] “Russo: Qualquer pessoa com origem russa a qual não goze ou a qual não tenha mais gozado da proteção do Governo da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e a qual não tenha adquirido outra nacionalidade. Armênios: Qualquer pessoa com origem armênia anteriormente súditos do Império Otomano a qual não goze ou a qual não tenha mais gozado da proteção do Governo da República da Turquia e a qual não tenha adquirido outra nacionalidade” (Tradução livre). Cf.: LEAGUE OF NATIONS, op. cit., 1926.

[77] Principio fundamental do direito dos refugiados, em virtude do qual nenhum Estado poderá devolver o indivíduo ao país de onde ele está fugindo, pondo de nenhum modo o refugiado nas fronteiras do território de onde sua vida ou liberdade estejam ameaçadas. Posteriormente, na Convenção de 1951, esse principio passou a ser positivado.

[78] LEAGUE OF NATIONS. Arrangement Relating to the Legal Status of Russian and Armenian Refugees, 30 June 1928. League of Nations Treaty Series, Vol. LXXXIX, No. 2005. Disponível em: <http://www.unhcr.org/refworld/docid/3dd8cde56.html>. Acesso em: 23 abr. 2008.

[79] FISCHEL DE ANDRADE, op. cit., 1996b, p. 54.

[80] LOESCHER, op. cit., 1993.

[81] Nansen International Office (1930-1938).

[82] Convention Relating to the International Status of Refugees of 28 June 1933.

[83] LOESCHER, op. cit., 1993.

[84] “Uma série de direitos que os refugiados receberam foram especificados, incluindo educação, emprego no país receptor e documentos de viagem” (Tradução livre). Cf.: LOESCHER, op. cit., 1993, p. 37.

[85] “a presente Convenção é aplicável aos refugiados russos, armênios e assimilados, tal como definidos pelos Ajustes de 12 de maio de 1926 e de 30 de junho de 1928, sujeitos às modificações ou ampliações que cada Estado Contratante pode introduzir nesta definição no momento da assinatura ou da adesão” (Tradução livre). Cf.: LEAGUE OF NATIONS. Convention Relating to the International Status of Refugees, 28 October 1933. League of Nations, Treaty Series Vol. CLIX No. 3663. Disponível em: <http://www.unhcr.org/refworld/docid/3dd8cf374.html>. Acesso em: 23 abr. 2008.

[86] LEAGUE OF NATIONS. op. cit., 1933.

[87] “A perda da condição nacional por mudança ou incompatibilidade, fruto de atos deliberados dos indivíduos, não é o caso daqueles que se convertem coletivamente em apátridas, não pelo que fizeram ou pensaram, mas pura e simplesmente porque nasceram ou eram membros de uma classe, de uma raça ou de um grupo nacional. Estas desnacionalizações maciças pronunciadas pelos regimes soviético e nazista, independentemente da conduta específica das pessoas e no contexto das restrições à livre circulação das pessoas que caracterizaram o primeiro pós-guerra, fizeram com que o problema dos apátridas de torna-se um problema inédito”. Cf.: LAFER, Celso. A reconstrução dos Direitos Humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p. 144. Ver também: AGAMBEN, op. cit., 1996. p. 20-29.

[88] LAFER, op. cit., 1988.

Ende der Leseprobe aus 125 Seiten

Details

Titel
Direito Internacional dos Refugiados na América Latina. O Plano de Ação do México e o Vaticínio de Hannah Arendt
Hochschule
Universidade Federal de Santa Maria  (Law Department)
Veranstaltung
Master in Latin American Integration
Note
10
Autor
Jahr
2009
Seiten
125
Katalognummer
V317714
ISBN (eBook)
9783668169142
ISBN (Buch)
9783668169159
Dateigröße
1329 KB
Sprache
Portugiesisch
Schlagworte
Direito Internacional dos Refugiados, América Latina, Plano de Ação do México, Hannah Arendt
Arbeit zitieren
Stefania Barichello (Autor:in), 2009, Direito Internacional dos Refugiados na América Latina. O Plano de Ação do México e o Vaticínio de Hannah Arendt, München, GRIN Verlag, https://www.grin.com/document/317714

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